Há 35 anos, cinco músicos alemães solidificaram os alicerces do estilo que ficou conhecido como power metal - o popular metal melódico no Brasil. Em 28 de agosto de 1988, o Helloween lançou a obra-prima Keeper Of The Seven Keys: Part II, terceiro álbum na até então curta, porém meteórica carreira.
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Para contarmos a história deste disco é necessário falar sobre o antes, o durante e o depois. Em meados dos anos 1980, Kai Hansen (vocal/guitarra), Michael Weikath (guitarra), Markus Grosskopf (baixo) e Ingo Schwichtenberg (bateria) já haviam chamado atenção com o EP Helloween e o icônico debut Walls Of Jericho.
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Mas foi como em um conto de fadas que, em 1986, a abóbora começou a virar carruagem. Sobrecarregado com as funções de vocalista e guitarrista, Hansen decidiu focar apenas nos seis cordas. O desconhecido Michael Kiske foi convidado para assumir o posto. Com apenas 18 anos, o vocalista fazia parte da banda Ill Prophecy.
>> Ouça a única demo lançada pelo Ill Prophecy
Contudo, apesar do relativo sucesso do Helloween com Walls Of Jericho, as negociações para a chegada do novo frontman não foram fáceis. Em entrevistas, Kiske disse ter relutado em aceitar o convite, pois odiou o disco e achava que as músicas pareciam todas iguais. No fim, o vocalista disse sim à banda.
Em meio à empolgação com a nova formação, o Helloween pensou em um projeto audacioso para promover o vocalista recém contratado. A ideia era lançar Keeper Of The Seven Keys como um álbum duplo, mas a proposta foi rechaçada pela Noise Records - não se sabe se a gravadora vetou por falta de grana ou por não acreditar no projeto. Então, em 1987, a banda lançou Keeper Of The Seven Keys: Part I.
Reunindo clássicos como I'm Alive, A Little Time, Twilight of the Gods, A Tale That Wasn't Right, Future World e Halloween, a primeira parte do Keeper já trazia elementos que mudariam a forma de se fazer heavy metal. Após uma bem sucedida turnê de divulgação, o Helloween se mandou para o Horus Sound, em Hannover, e deu inícios às gravações do seu terceiro álbum de estúdio.
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Gravado entre maio e junho de 1988 sob a batuta do produtor Tommy Hansen, Keeper Of The Seven Keys: Part II representa uma nova era no metal. Com uma sonoridade de vanguarda, o disco aborda uma estética musical que mescla velocidade e uma pegada recheada de muita melodia - imortalizada nas cristalinas progressões rítmicas que viraram uma marca registrada do Helloween.
A tracklist com 9 faixas - ou 10, se analisarmos as versões que incluem a música Save Us - passeia por diversos sons. Tem de tudo: power metal clássico, como em Eagle Fly Free, March Of Time e Save Us; metal tradicional na faixa You Always Walk Alone; uma pegada mais comercial em Rise And Fall; hard rock em Dr. Stein e I Want Out; uma balada metálica em We Got The Right; e a progressiva faixa-título.
Em termos de desempenho individual, é absolutamente impossível não render-se aos vocais de Kiske. Com apenas 20 anos quando o disco foi lançado, o vocalista era um fenômeno em ascensão. Alcançando tons altíssimos com a tranquilidade de alguém que passeia pelo shopping em uma tarde de domingo, ele brilha do primeiro ao último minuto e mostra que a insistência da banda em tê-lo como frontman valeu a pena.
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Apesar das limitações da Noise Records, que era uma gravadora pequena, Keeper Of The Seven Keys: Part II obteve um relativo sucesso comercial. O álbum ocupou o quinto lugar no chart alemão - sendo certificado como Disco de Ouro - e conseguiu a façanha de figurar na 108º posição na lista Billboard Top 200. Além disso, o clipe de I Want Out foi exibido massivamente na MTV americana.
O Helloween parecia pronto para voar. A banda foi escalada como open act do Iron Maiden na perna europeia da Seventh Tour Of A Seventh Tour. Com shows enérgicos e um excelente disco na praça, a banda chamou atenção de Rod Smallwood, manager da Donzela, que passou a gerenciá-los. Smallwood rapidamente conseguiu um contrato para o Helloween com a gigante EMI.
O ano de 1989 seria de "folga" para o Helloween. Ainda sob contrato com a Noise Records, a banda lançou o EP ao vivo Live In The U.K - no Japão saiu com o nome de Keepers Alive e um encarte capaz de fazer qualquer fanbase suspirar - e movia-se nos bastidores para o primeiro trabalho em parceria com a EMI e a Sanctuary Music. Contudo, o que era para ser o momento do Helloween estourar...
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Kai Hansen, apontado por muitos como o verdadeiro pai do power metal, deixou a banda ainda em 1989 e foi substituído por Roland Grapow. A partir daí, o Helloween virou uma enorme confusão. Sem uma das principais mentes criativas e repleto de problemas internos, o tão aguardado novo disco - Pink Bubbles Go Ape - só foi lançado em 1991 e desapontou por não seguir a linha estabelecida pelo Keeper Part II.
>> As diferentes cores de Chameleon, o "polêmico" álbum do Helloween
O álbum seguinte, Chameleon (1993), quase sepultou a carreira do Helloween. Experimental demais para os fãs, o disco foi um fiasco de vendas, o que culminou na demissão da banda da EMI. Como se isso não bastasse, o ambiente interno era o pior possível, com intermináveis brigas entre Kiske e Weikath. O resultado de tanta treta foi a saída do vocalista após a turnê.
>> O panzer alemão chamado Ingo Schwichtenberg
Outro ponto triste no fim do período clássico do Helloween envolve o baterista Ingo Schwichtenberg. Cofundador da banda e conhecido pelo apelido de Senhor Sorriso, o músico estava envolvido com o consumo excessivo de drogas e enfrentava problemas relacionados à saúde mental. Afastado de diversos shows para cuidar da saúde, o baterista foi demitido do Helloween ao término da tour. Em 1995, aos 29 anos de idade, Ingo Schwichtenberg cometeu suicídio*.
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Sempre que paro para observar a história do Helloween, fico com a sensação de que a banda poderia ter ido muito além em termos comerciais. Acredito até que os alemães tinham tudo para preencher o vácuo deixado pelo Iron Maiden nos anos 1990, após a saída de Bruce Dickinson. No entanto, os problemas internos impossibilitaram qualquer chance disso acontecer.
Entretanto, é inegável a importância que Keeper Of The Seven Keys: Part II tem na história do heavy metal. Elevado ao status de cult junto com o Part I, o disco estabeleceu uma nova forma de tocar metal, que continua sendo referência até os dias de hoje, e colocou o Helloween na prateleira das bandas mais influentes de todos os tempos.
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* O CVV – Centro de Valorização da Vida realiza apoio emocional e prevenção do suicídio, atendendo voluntária e gratuitamente todas as pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo por telefone, e-mail e chat 24 horas todos os dias. Ligue 188 ou acesse cvv.org.br.
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