Ulver, a trilogia: aventuras, canções e hinos para lobos e homens

A Noruega estava em chamas no início dos anos 1990. Igrejas queimavam por todo o país, Euronymous foi assassinado e muitos outros crimes eram cometidos supostamente em nome do black metal. Mesmo pertencente a cena, mas alheio a estes acontecimentos, surgia em 1993, em Oslo, o Ulver

Formado pelo vocalista Kristoffer "Garm" Rygg, o Ulver é um verdadeiro camelão no que diz respeito à sonoridade. Hoje, com quase 30 anos de estrada, a banda vive uma exitosa fase synph-pop graças a lançamentos como The Assassination Of Julius Caesar (2017) e Flowers Of Evil (2020). 

>> Resenha: Flowers Of Evil

Contudo, voltemos no tempo - mais precisamente entre a segunda metade e o final dos anos 1990 - para falar daquela fase que ficou conhecida como A Trilogia Black Metal. Abrangendo os três primeiros discos do Ulver, este período é a única conexão - em termos musicais - com o restante da Noruega naquela época. 

Mesmo pertencentes ao mesmo espectro sonoro, os álbuns divergem entre si. Cada um apresenta um estilo diferente. Enquanto Bergtatt - Et Eeventyr i 5 Capitler (1995) flerta com o black metal mais atmosférico e por vezes o folk metalKveldssanger (1996) apresenta um Ulver neoclássico. Já Nattens Madrigal  -  Aatte Hymne Til Ulven I Manden (1997) é um álbum de black metal puro. 

Bergtatt  -  Et Eeventyr i 5 Capitler

Batizado Bergtatt  -  Et Eeventyr i 5 Capitler (Bergtatt- Uma Aventura em 5 Capítulos), o álbum de estreia do Ulver chegou ao mercado em fevereiro de 1995 pela extinta Head Not Found. Tendo no seu line-up Garm (vocal), Haavard e Aismal (guitarras), Skoll (baixo) e AiwarikiaR (bateria), o disco é uma ótima mescla entre o black e o folk metal

A faixa de abertura Capitel I: I Troldskog faren vild sintetiza bem o que banda buscava no primeiro disco. Apesar dos contornos melancólicos que permeiam o álbum, o trabalho não tem aquela "áurea satânica" presente nos demais lançamentos da cena à época. Muito pelo contrário, soa misteriosamente acolhedor - muito pela inclusão dos elementos de música folk

Com críticas positivas na época do lançamento, Bergtatt  é considerado o pontapé inicial no estilo que ficou conhecido posteriormente como atmospheric black metal

Kveldssanger

Em trio, o Ulver lançou em 1996 aquele que é considerado por muitos como o melhor álbum da banda  -  e não só dentro da trilogia. Inspirados em canções folclóricas norueguesas, Kveldssanger (Canções do Crepúsculo) não foi nenhuma surpresa  -  apesar de muita gente ter se surpreendido com o lançamento.

O fortíssimo flerte com o folk em passagens acústicas no disco anterior davam uma pista do que poderia vir mais à frente. Talvez ninguém esperasse um disco totalmente neoclássico e acústico, mas isto não deveria ser tratado como surpresa se assim acontecesse - e aconteceu.

A beleza ímpar ao longo das 13 canções de Kveldssanger impressiona. O cuidado com os arranjos e vocalizações contribuem para que o disco soe além da média. Se na época alguém torceu o nariz pela ausência do black metal no álbum, essa pessoa não compreendeu a grandeza deste lançamento.

Nattens Madrigal  -  Aatte Hymne Til Ulven I Manden

Impulsionado pela boa recepção de Kveldssanger, o Ulver assinou contrato com a Century Media para o lançamento do primoroso disco intitulado Nattens Madrigal  -  Aatte Hymne Til Ulven I Manden (Madrigal da Noite  -  Oito Hinos Para Lobos e Homens). 

Novamente como um quinteto (a mesma formação do primeiro álbum), os Lobos compuseram um álbum feroz como o animal que tanto prestigiam! Garm rosna como um lobo raivoso enquanto a matilha que o acompanha ataca o ouvinte com riffs e melodias assombrosas.

Musicalmente o disco é um black metal primitivo e vigoroso. Nattens Madrigal é uma AULA de como se compor riffs! Sim, os melhores riffs do estilo estão neste disco. 

Há quem questione a produção crua adotada em Nattens Madrigal e afirme que ele seria melhor se soasse limpo como o Bergtatt. Particularmente discordo. Toda chiadeira ao longo do disco misturado com riffs estridentes e sujíssimos é que faz dele único!

Para mim, Nattens Madrigal  -  Aatte Hymne Til Ulven I Manden está no mesmo patamar de clássicos que A Blaze In The Northern Sky, do DarkThronePure Holocaust, do ImmortalDe Mysteriis Dom Sathanas, do Mayhem; e In The Nightside Eclipse, do Emperor

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Ainda em 1997 logo após o lançamento de Nattens Madrigal, a Century Media compilou os três discos em um box chamado The Trilogie - Three Journeyes Through The Norwegian Netherworlde. Limitada em mil cópias, o box - hoje raríssimo - contêm os álbuns em vinil picture disc, cards, pôsteres e um livreto com informações sobre as letras. 

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No ano seguinte, o Ulver começou a experimentar outras sonoridades em Themes From William Blake's The Marriage Of Heaven And Hell dando início à uma nova fase na carreira...

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