Måneskin: a banda que faz do rock "mais do mesmo" algo diferente

Foto: Divulgação

Por Nathaly Miranda

Lápis de olho, maquiagem com glitter, peças de couro, salto alto, cabelos compridos, estilo andrógeno, uma guitarra simples mas bem ritmada… lendo isso, em quem você pensou: David Bowie, qualquer banda de rock dos anos 80, Adam Lambert, Spice Girls? Não seria errado pensar em nenhum desses, mas o nome da vez são os italianos da Måneskin.

Formada em Roma em 2015, a banda tem Damiano David no vocal, Victoria De Angelis no baixo, Thomas Raggi na guitarra e Ethan Torchio na guitarra. Apesar de serem novinhos (o mais velho é David, com 22 anos; De Angelis, 21; e Raggi e Torchio, 20), eles já fazem um som de gente grande e somam números de reprodução impressionantes com apenas dois álbuns e um EP gravados.

Tudo começou em 2017, quando eles acabaram ficando em segundo lugar do X Factor italiano e conseguiram assinar um contrato com a Sony Music. Mas foi em 2021 que finalmente se destacaram para o público europeu ao vencer o Eurovision, tradicional competição de música anual da União Europeia, que funciona mais ou menos como o nosso The Voice: os jurados votam, mas quem decide o vencedor são os espectadores, e foi exatamente isso que aconteceu. Eles não ganharam no voto dos jurados, mas sim do público, o que chamou a atenção da crítica, afinal, não é comum uma banda de rock cair nas graças do povo, ainda mais em uma competição continental.


Desde então a banda conquistou novos fãs com um som clássico porém não muito inovador, com riffs simples e cheios de ritmo, puxando para algo mais pop, e voz rasgada de Damiano bastante marcada, mas que empolga por fatores alheios à música. 


Foto: Reprodução/Instagram


Os quatro abusam da maquiagem, unhas pintadas, cabelões compridos e cheios dos anos 80, muitas joias e possuem um jeito de se vestir não muito comum para uma banda de rock dos anos 2020. Se você procurar fotos da Måneskin, verá que os homens muitas vezes usam saias, vestidos e macacões, enquanto Victoria, a única mulher, veste terno, roupas mais soltas que não marcam o corpo ou peças consideradas “menos femininas”. Os integrantes também misturam muitos elementos do glam rock, como salto alto, roupas de renda e tons de rosa junto ao preto. Foi desse jeito que a Måneskin conquistou a internet, mostrando de uma vez por todas que não existe mais espaço para o preconceito na música, muito menos entre as gerações mais novas.


Após vencer o Eurovision, a banda ganhou também uma turnê europeia de shows e aparições na televisão. Em junho deste ano, mês do orgulho LGBTQIA+, em uma apresentação ao vivo na qual tocaram I Wanna Be Your Slave na rede de TV pública polonesa, David e Raggi se beijaram, foram ovacionados pelo público e ainda mandaram um recado para os intolerantes na Polônia:


“Acreditamos que todos deveriam poder fazer isso sem medo. Acreditamos que todos deveriam ser totalmente livres. Obrigado, Polônia! O amor nunca é errado!”


O discurso foi uma clara crítica ao conservador, religioso e homofóbico governo polonês, que vem ameaçando os direitos instituídos à população LGBTQIA+. Segundo um levantamento da Associação Internacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transsexuais e Interssexo da Europa (ILGA-Europe, na sigla original), a Polônia é o pior país da União Europeia para pessoas pertencentes à comunidade LGBTQIA+. A escolha da música foi proposital: I Wanna Be Your Slave fala sobre diversidade sexual, de aceitar as várias faces da sexualidade humana sem medo e sem preconceito. O recado foi dado.


Se o objetivo deles era chamar a atenção do mundo, estão fazendo um ótimo trabalho: antes pouco conhecidos fora da Itália, agora a Måneskin já soma quase 47 milhões de ouvintes mensais no Spotify. O vídeo da performance de Zitti e Buoni, música com a qual venceram a final do Eurovision, possui 68 milhões de visualizações. No final de julho, o Instagram oficial da banda soma mais de 5 milhões de seguidores. O clipe de I Wanna Be Your Slave estreou no YouTube no dia 16 de julho e já bate as 25 milhões de visualizações. A internet foi essencial para conquistar novos fãs e ajudar a banda a viralizar, principalmente em plataformas como TikTok e Twitter


Foto: Gabrielle Giussani

Em julho, o quarteto chegou ao primeiro lugar no top 50 global do Spotify com o cover de Beggin’ (a gravação original é do The Four Seasons, de 1967), desbancando a fenômeno Olivia Rodrigo, que ocupava o topo há semanas e chegou a ter 10 músicas (o álbum Sour, lançado em maio de 2021, tem 11 canções) no chart mundial simultaneamente. Isso foi graças ao TikTok, onde usuários podem escolher as músicas mais “em alta” como trilha sonora de seus vídeos. E ainda há quem diga que o rock morreu.

Apesar de uma atitude inovadora, de um visual desconstruído e de pensamentos progressistas que tanto fizeram falta na indústria musical nos últimos tempos, principalmente no rock, a sonoridade do grupo não é diferenciada e nem inova. Segundo a própria banda, o som deles é algo no meio termo entre o tradicional e o novo. Pelo jeito os críticos concordam, pois a Måneskin já foi comparada com os Rolling Stones e com o Fleetwood Mac, mas também com Greta Van Fleet e Harry Styles. As músicas são simples, mas isso não tira de forma alguma o mérito dos quatro integrantes da banda.


Se você ainda não teve contato com nenhuma música da Måneskin, o único conselho é que não deixe de ouvir as em italiano por não entender a língua, pois valem muito a pena. Recomendo que, para começar, dê play na premiada Zitti e Buoni, que é carregada de riffs simples e gostosos e da voz rouca de David. Com uma sonoridade completamente diferente, Coraline também vale a pena ser destacada pela simplicidade e por ter uma virada drástica, apesar de ser uma balada. Torna a Casa segue o mesmo caminho onde a voz se sobrepõe aos instrumentos, menos à bateria forte de Torchio, que ganha destaque em várias faixas do álbum Teatro d'ira - Vol. I. Caso você seja ativo na internet, é difícil ainda não ter ouvido o cover de Beggin’, mas, caso não tenha, ele é obrigatório, assim como I Wanna Be Your Slave, a música que causou polêmica lá na Polônia. 


Foto: Iwan Palombi


O futuro parece bem promissor para a banda. Mesmo com a pandemia ainda em curso, eles já venderam mais de 100 mil ingressos para os shows que acontecerão na Itália e estão com a agenda lotada até o final do verão europeu de 2022. E nós, claro, estamos ansiosos para acompanhar os próximos passos desses quatro que já chegaram com muita vontade de levar mais tolerância e autenticidade para o mundo da música.


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