Real Spit One: o pior show do Iron Maiden

Foto: Stuart Mostyn/Redferns

Longe dos palcos desde 2019, o Iron Maiden retomou às turnês no domingo (22), em Zagreb, na Croácia, onde deu continuidade à Legacy Of The Beast Tour. Além disso, a Donzela incorporou ao show o conceito Senjutsu com três faixas do álbum lançado em 2021, cenário inspirado no Japão feudal e o Eddie Samurai. 

Com quase 50 anos de serviços prestados ao metal, o Iron Maiden notabilizou-se por, entre outras coisas, ser uma banda muito acima da média no palco. Shows enérgicos, precisão na execução das músicas, sinergia com o público - sem falar nos cenários faraônicos (com perdão do trocadilho). 

Mas como nem tudo são flores, a banda capitaneada por Steve Harris já passou alguns perrengues no palco - interferência nos equipamentos, calor extremo nos Estados Unidos, queda de energia, sabotagem previamente arquitetada (quem aí lembra do fatídico Ozzfest 2005?), e cuspes... muitos cuspes! 

1990: A DÉCADA DO CAOS

Foto: Divulgação

Tendo vivido o apogeu nos anos 1980, no período carinhosamente denominado golden years, o Iron Maiden adentrou a década seguinte em um declínio sem precedentes. Duas situações podem ser apontadas como o estopim para a queda: o lançamento do primeiro álbum solo de Bruce Dickinson em 1990, que deu ao vocalista o gostinho de ser ele mesmo dono do próprio nariz; e a saída de Adrian Smith que, insatisfeito com os rumos musicais que Harris pretendia seguir, pulou do barco - Janick Gers assumiu o posto de guitarrista. 

Além disso, o metal, muito popular nos anos 1980, perdeu popularidade em 1990 graças ao avanço de outros estilos. Sem conseguir se reinventar, muitas bandas sofreram com números aquém daquilo que estavam habituadas. O Iron Maiden, mesmo aos trancos e barracos, conseguiu sobreviver. Outras, sucumbiram. 

Em outubro de 1990 chega às lojas No Prayer For The Dying que, com uma proposta de "volta às raízes", não agradou e acendeu o sinal de alerta. Em 1992, Fear Of The Dark deu um respiro à Donzela e os danos pareciam contidos com uma exitosa turnê que passou pelo Brasil e uma noite de headliner no lendário Monsters Of Rock, em Donington Park, na Inglaterra. 

Com a pausa na primeira perna da tourDickinson entrou em estúdio para dar início às gravações do segundo álbum solo. Nesse interim, o vocalista recebeu Rod Smallwood em Los Angeles e comunicou ao empresário que deixaria o Iron Maiden. O vocalista, no entanto, se prontificou a realizar a segunda perna da turnê ou até mesmo gravar mais um disco. 

REAL LIVE TOUR 

A opção escolhida pela banda foi dar prosseguimento à turnê servindo como uma espécie de despedida para Dickinson. O setlist foi modificado e abriu espaço para clássicos do calibre de Where Eagles Dare, Prowler e Transylvania. Contabilizando 45 apresentações em cinco meses, a decisão de prosseguir com tour mostrou-se equivocada a medida em que ela seguia. 

Não é novidade para ninguém que, dependendo da praça onde o show era realizado, Bruce simplesmente subia no palco com extrema apatia e má vontade. Por conta do péssimo desempenho do cantor - seja lá por qual motivo -, não demorou para que o clima na banda ficasse insustentável e as trocas de farpas rolassem publicamente. A partir daí, como diz o meme, essa festa virou um enterro. 

E o fã, que não é bobo nem nada, percebeu a situação e começou a protestar. Só que o fã é passional e os protestos em alguns momentos saíram do controle. Para eles, Dickinson estava traindo uma legião de adoradores ao abandonar o barco.

Assim, nesse clima extremamente pesado e hostil, o Iron Maiden realizou, em 27 de abril de 1993, aquele que é considerado um dos piores shows - pelo menos entre aqueles que se tem registro - da banda. 

REAL SPIT ONE - ITALIAN HORROR 


A Donzela 
desembarcou na Itália no fim de abril para a perna local da turnê que teve início no Palasport, em Turim, no norte do país. E não precisou de muito tempo para que o caos desse o ar da graça. Já em Be Quick Or Be Dead, primeira música do set, o clima entre Bruce Dickinson e o público já havia azedado - basta perceber que o tradicional grito que abre a música não estava lá. 

Registrado no bootleg Real Spit One - Italian Horror, o show seguiu com The Number Of The Beast em mais uma atuação vocal muito aquém daquilo que o fã está acostumado. Ao fim da música, Bruce pediu a palavra e disse que alguém havia cuspido nele, e que se o episódio ocorresse novamente - fosse cuspindo nele ou na banda - o Iron Maiden abandonaria o palco. 

O esporro de Dickinson na plateia não surtiu efeito. Em Prowler, terceira música da noite, o vocalista foi novamente atingido por um cuspe e abandonou o palco logo em seguida. Um desesperado Steve Harris tentou assumir os vocais, mas logo desistiu. No instrumental antes do solo é possível ouvir um fã perguntando "o que aconteceu?". 

Ao término, o vocalista volta ao palco dizendo "Muito simples, entenderam? Se cuspirem, não tem show" ao mesmo tempo em que parece ter identificado o agressor. "Foi você? Você cuspiu? Você me ama? Se você cuspir eu te mato! É muito simples. De onde eu venho não é legal cuspir nas pessoas". Com uma bronca mais contundente, o show seguiu com Transylvania e Remember Tomorrow

Foto: Reprodução/YouTube

A partir daí a apresentação foi meramente protocolar. Enquanto a banda se manteve afiada na execução das músicas, Bruce alternava momentos razoáveis e péssimos. Em algumas canções ele parecia fazer algum tipo de esforço - como em Bring Your Daughter... To The Slaughter e Sanctuary - e em outras o desinteresse era mais do que notório - como na dobradinha From Here To Eternity e Wasting Love

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A Real Live Tour seguiu até agosto de 1993. O derradeiro show com Bruce na função de frontman do Iron Maiden foi no dia 28 daquele mês, em Londres, no evento que deu origem ao dvd Raising Hell

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Em 1996, já com Blaze Bayley nos vocais, banda passou por uma situação semelhante no Chile. Na ocasião, durante a The X-Factour, um fã cuspiu insistentemente em Bayley e Harris. Furioso, o baixista largou o instrumento no chão e confrontou o agressor - que foi posto para fora do local do show.

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Bruce Dickinson retornou ao Iron Maiden em março de 1999. Desde então, o único show conturbado que se tem notícia é o Ozzfest 2005. Mas este é um papo para outro texto...






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